Integrar caminhos, povos e conhecimentos no coração da América Latina

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A invenção da bússola, no século XIII, revolucionou o mundo. O instrumento permitiu ao homem, pela primeira vez, traçar novas rotas e explorar novos destinos. Mas, atualmente, para encontrarmos os melhores caminhos, utilizamos o GPS (Global Positioning System), que é uma espécie de “bússola” moderna, com muito mais recursos. Nesta perspectiva, podemos dizer que o conhecimento tem o mesmo papel de uma bússola ou de um GPS, o de encontrar os melhores “caminhos”. Então, nada mais estratégico que unir inteligências, culturas e vivências de diferentes povos para a construção de um projeto comum: a RILA (Rota de Integração Latino-americana).

A RILA, também chamada de Rota Bioceânica, é um dos projetos mais importantes para o desenvolvimento de Mato Grosso do Sul, já que tem o objetivo de encurtar os caminhos para as exportações e importações do Estado até a Ásia e a América do Norte, fazendo um percurso que corta a América do Sul, saindo do Brasil, passando pelo Paraguai, pela Argentina e chegando, assim, aos portos do Chile, que estão no Oceano Pacífico.

Com a iniciativa do Setlog (Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas e Logística), iniciou-se a empreitada para a implantação da RILA. “O mais importante desta rota não é só a ligação entre os dois oceanos, é trazer desenvolvimento por onde ela passa. Nós do Setlog acreditamos que ferrovia, transporte fluvial ou cabotagem são muito importantes para o desenvolvimento de qualquer país, principalmente um país continental como o Brasil. Mas não podemos nunca esquecer que é a rodovia que traça o desenvolvimento para todas as regiões na qual ela passa. Estamos muito esperançosos e envolvidos para que esse projeto se desenvolva na sua plenitude e que tenhamos a inauguração daqui a quatro anos”, afirmou o presidente do Setlog, Cláudio Cavol.

A oportunidade de um “caminho” que atravessa a América do Sul uniu, não apenas empresários e governos, mas também as universidades da Argentina, do Brasil, do Chile e do Paraguai, surgindo assim a UniRila (Rede Universitária da Rota de Integração Latino-Americana).

Para o reitor da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), Fábio Edir dos Santos Costa, a UniRila é emblemática porque, pela primeira vez, uma universidade do Estado coordena uma ação de âmbito internacional, com países da América do Sul. “Estamos todos envolvidos com o mesmo objetivo: o fortalecimento de uma ação estratégica para a América do Sul. Com estas ações as Universidades extrapolam as suas fronteiras acadêmicas, juntas podemos contribuir na geração de conhecimento, desenvolvimento e empoderamento das nossas comunidades para as mudanças que acontecerão nos próximos anos”.

O Professor Lucio Flavio Sunakozawa, assessor de relações institucionais da UEMS destaca que a RILA tem despertado a atenção não só de empresários e governos, mas, sobretudo, da comunidade nacional e internacional. “Fomos convidados para exposição e debates na conferência internacional em São Paulo (Mackenzie), com temas que preocupam o mundo globalizado, como as questões climáticas e migração, inclusive com a participação da OIM (Organização Internacional da Migração) e da rede internacional Open Planet que contempla várias universidades brasileiras e europeias”.

UniRila

A Rede Universitária da Rila começou a ser criada no segundo semestre de 2016, mas foi constituída, oficialmente, em outubro deste ano, durante o I Seminário da UniRila. O evento aconteceu nos dias 22, 23 e 24, em Campo Grande, e reuniu representantes de Instituições de Ensino Superior dos quatro países.

A UniRila é composta pelas Universidades que compõem o CRIE-MS (Conselho de Reitores das Instituições de Ensino Superior de Mato Grosso do Sul). São elas: UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul), UCDB (Universidade Católica Dom Bosco, UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, (UFGD) Universidade Federal da Grande Dourados, Universidade Anhanguera/Uniderp e IFMS (Instituto Federal de Mato Grosso do Sul.

Além das Universidades do CRIE-MS, também fazem parte da Rede, a Universidade Nacional de Jujuy e a Universidade Nacional de Salta, da Argentina; Universidade de Antofagasta e Universidade Católica do Norte do Chile, ambas do Chile; e a Universidade Nacional de Assunção, do Paraguai.

O I Seminário da UniRila é uma das ações para garantir o fortalecimento dessa integração. Além de representantes pesquisadores e representantes das IES (Instituições de Ensino Superior), estiveram presentes diversas autoridades dos setores governamentais e empresariais, como a Embaixada do Chile no Brasil, o Ministério de Relações Exteriores do Brasil, o DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte), a Secretaria de Infraestrutura do Estado de Mato Grosso do Sul, a ACICG (Associação Comercial e Industrial de Campo Grande), o Setlog, a Prefeitura de Campo Grande e a Prefeitura de Porto Murtinho, além da reitora da Universidade Estadual de Londrina (UEL) Berenice Quinzani Jordão, presidente do Zicosur.

Durante o evento, os pesquisadores das Universidades da UniRila se reuniram em Grupos de Trabalho e discutiram as futuras ações, em diversas áreas, a serem realizadas para a implantação da Rota nos países.

Com a união de tantas expertises, as potencialidades de pesquisas aumentam. De acordo com o Ministro, diversos nichos de pesquisas podem ser explorados em conjunto pelos pesquisadores do Brasil e dos outros países.

“A RILA possui inúmeras demandas de pesquisas e as Universidades podem contribuir muito. Como na elaboração de um aplicativo ou site que compile informações turísticas e aduaneiras da RILA; no mapeamento comercial das regiões envolvidas, com o cruzamento de demanda e mercado; e no fluxo modal e logístico de todo o trajeto, com uma pesquisa identificando os melhores modos de transporte das cargas. Essas pesquisas podem e devem ser executadas em conjunto entre as Universidades. A RILA é uma demanda da sociedade civil, nesse sentido, a integração das Universidades dá exemplo aos governos”, afirmou o Ministro das Relações Exteriores, João Carlos Parkinson de Castro.

"A RILA é uma demanda da sociedade civil, nesse sentido, a integração das Universidades dá exemplo aos governos"

João Carlos Parkinson de Castro

Ministro das Relações Exteriores
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Entre as ações de fortalecimento das pesquisas, está a implantação de um curso de pós-graduação Lato Sensu em Transporte Logístico e Direito Aduaneiro, que será oferecido pela UEMS, em conjunto com as Universidades que compõem o CRIE-MS.

“Esse curso, que inicialmente será oferecido em Mato Grosso do Sul, poderá ser replicado nos demais países parceiros, com a intenção de capacitar os agentes e gestores econômicos da RILA. Pretendemos garantir aos povos dessas regiões, o desenvolvimento social com a consolidação da rota”, finalizou o reitor da UEMS, Fábio Edir.

Uma outra proposta é a criação de um convênio multilateral que reuniria Universidades públicas e privaras do Brasil, Chile, Argentina e Paraguai para cooperação acadêmica, de docentes e de pesquisas.

“Devemos reunir em um banco de dados todas as pesquisas realizadas pelas Universidades para que o acesso fique mais facilitado”, disse a professora Margarita Almada, da Universidade de Salta (Argentina).

Na questão de internacionalização, a professora Beatriz Elvira, assessora de Relações Internacionais da Universidade Nacional de Jujuy (Argentina) ressaltou um grande gargalo dos países latinos. “Muitas vezes nos preocupamos com as questões econômicas que envolvem a mobilidade acadêmica, mas nos esquecemos da grande dificuldade que nossos alunos têm com outras línguas, como inglês e francês. Temos que nos atentar para isto”, disse Beatriz.

Com a integração entre universidades na América Latina, será feito um mapeamento das potencialidades de ensino, pesquisa e extensão das universidades participantes da UniRila. Além da criação de um programa de mobilidade de docentes/pesquisadores e estudantes e elaboração de um regulamento de mobilidade.

Serão propostos projetos que permitam determinar o estado atual da situação sociocultural, linguística, econômica, política e sanitária da zona compreendida pela Rota. E a promoção de ações para minimizar as consequências negativas que o desenvolvimento da Rota possa acarretar nas comunidades envolvidas.

“A RILA traduz um portal de esperanças na geração de novos conhecimentos, pesquisas, oportunidades econômicas, preservação ambiental, inclusão e integração”, afirma o assessor da UEMS, Lucio Flavio Sunakozawa.

Potencialidades e Impactos

A nova Rota não beneficiará apenas a economia, mas o desenvolvimento das cidades e, consequentemente, dos povos e também do Turismo. De acordo com o Ministro das Relações Exteriores, R$ 89 milhões estão garantidos pelo orçamento para investimentos na rota – construção da ponte sobre o Rio Paraguai, entre Porto Murtinho (Mato Grosso do Sul) e Carmelo Peralta (Paraguai) - e mais R$ 100 milhões do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), além do investimento que será feito pelo governo paraguaio, na ordem de R$ 400 milhões, para a pavimentação asfáltica em seu território, até a divisa com a Argentina.

Rila: Unindo povos, culturas e saberes

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Ponte da integração Latino-americana

A ponte que será construída sobre o rio Paraguai é um dos destaques do projeto. Ela será de concreto e terá 500 metros de comprimento. Optou-se por um local de menor extensão do canal do rio para reduzir custos. O valor da obra foi estimado em R$ 140 milhões.

De acordo com a bancada federal, que representa Mato Grosso do Sul no Congresso Nacional, coordenada pelo Senador Waldemir Moka, os recursos para a construção da ponte virão do Governo Federal através de uma emenda impositiva, que deve ser contemplada no Orçamento da União de 2018. O investimento do Brasil para a construção da ponte deve chegar a cerca de R$70 milhões, já que o governo do Paraguai vai pagar a metade da obra.

Para o secretário de Estado de Infraestrutura, Marcelo Miglioli, o esforço dos senadores e deputados, junto ao Governo do Estado de Mato Grosso do Sul estão garantindo a infraestrutura da RILA em solo brasileiro. “Este deve ser um projeto de Estado, por isso é fundamental a participação de todos dos governos federais e estaduais, e da sociedade civil. Esse projeto não é mais um sonho, é uma realidade bem próxima com todos essas questões já providenciadas”, enfatizou Miglioli.

Para o prefeito de Porto Murtinho, Derlei Delevatti, com a ponte, o município terá uma evolução enorme. “Nós temos muita riqueza de forma bruta, de forma não lapidado, por isso temos interesse em discutir essas transformações. Temos uma população humilde que não está preparada ainda, mas vamos nos preparar! Estamos na expectativa de aprender, de estudar para que as coisas aconteçam da melhor maneira possível, se a ponte ocorrer em três anos ela significará uma evolução de cem anos para Porto Murtinho”, disse.

Ponte sobre o Rio Paraguai

RUMO AO DESENVOLVIMENTO

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Levantamento econômico e ambiental

As universidades brasileiras da UniRila farão um Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (EVTEA) da área e do entorno imediato do traçado da Ponte sobre o Rio Paraguai.

De acordo com o chefe de planejamento e projetos do DNIT, Ricardo de Mello Scaliante, neste estudo preliminar será verificado quais benefícios e prejuízos que a Ponte trará à população, abordando todos os componentes ambientais (físicos, bióticos, socioeconômicos e antrópicos). Com base nos benefícios, será analisado o tempo de retorno do investimento aplicado.

“Esse estudo tem uma faixa de preço de R$ 75 a R$ 100 mil, pela tabela de referência do DNIT. Como as Universidades farão o levantamento, será economizado neste valor e no tempo de execução do estudo. Na contratação seria preciso fazer licitação, com média de 6 meses de duração, mais uma média de 6 a 9 meses para empresa a entrega do estudo, analisou Scaliante.

Desenvolvimento Local e do Turismo

“A rota será mais que um tráfego de mercadorias, será um fator de integração dos nossos territórios, porque tem muita riqueza cultural, muita riqueza paisagística e muita riqueza econômica, portanto, é uma janela de oportunidades, para aumentar os intercâmbios de todo tipo em uma parte muito importante da América do Sul e que tem um potencial de expansão”, ressaltou o embaixador do Chile no Brasil, Jaime Gazmuri Mujica.

E é neste espírito que a Rota está sendo construída, que essa integração gerada pela RILA mostre as riquezas dos países e povos. Pois como enfatizou o Ministro Parkinson, “a ideia é que o corredor não seja somente para escoação de grãos, e sim um vetor de desenvolvimento econômico, é a soma das ações de buscar a coletividade”.

RIQUEZA

CULTURAL

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No setor turístico, as Universidades deverão fazer diversos levantamentos quanto às potencialidades e quanto aos impactos econômicos, sociais e ambientais da demanda de turistas para a Rota.

O Grupo de Trabalho de Desenvolvimento Local e Turismo da UniRila pretende elaborar diagnósticos que minimizem os impactos e maximizem os ganhos.

“O trajeto vai ficar mais curto e que viagens internacionais poderão ser feitas com mais rapidez e mais baratas. Os países pretendem fazer uma plataforma única de informações turísticas e compreender cada atrativo na rota e no seu entorno, para divulgar e fortalecer o turismo entre os países”, destacou o coordenador do grupo, Michel Constantino, da Universidade Católica Dom Bosco.

Com relação ao desenvolvimento local, o Grupo sugeriu o apoio aos municípios da Rota para elaboração de seu planejamento territorial; e a realização de diagnóstico econômico orientado ao Desenvolvimento Local e Regional.

Na área ambiental, a realização de pesquisa para identificar potencialidades e fragilidades da vida silvestre; a promoção de estudos conjuntos entre BR – PY de impactos ambientais sobre a construção da ponte sobre o Rio Paraguai: Porto Murtinho – Carmelo Peralta; Criação de um corredor biológico e áreas silvestres protegidas ao longo da Rota; e o levantamento da Flora e Fauna a partir de inventários, Número de coletas / Dias de campo / Metodologia e análise das rodovias – atropelamentos / redutores de velocidade.

Impacto social

A operacionalização da Rota Bioceânica provocará impactos culturais e sociais, cujos alcances ainda não foram projetados com segurança. Pois pelos caminhos da Rota, habitam diversos povos e etnias com modo de vida e culturas próprias.

O conhecimento produzido pelas Universidades poderá contribuir para que seja realizado um inventário sobre as condições em que vivem os povos das regiões, suas capacidades, seus potenciais, culturas, forma de organização, vulnerabilidades e necessidades. Essas informações são necessárias para o estabelecimento de estratégias que permitam a superação dos riscos naturais à construção e operacionalização da rota.

"Com estas ações, as Universidades extrapolam as suas fronteiras acadêmicas. Juntas poderemos contribuir na geração de conhecimento, de desenvolvimento."

Fábio Edir dos Santos Costa

Reitor da UEMS
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Durante o I Seminário da UniRila, os participantes produziram um documento, denominado como “Carta de Campo Grande”, que registra as principais preocupações e considerações a respeito da implantação da RILA nos países.

“Uma obra de tal grandeza deve ser antecedida por um conjunto de medidas preparatórias das comunidades locais. Essas comunidades devem ser protagonistas dos processos em desenvolvimento para implantação do corredor, ou seja, elementos ativos e em condições de exercer influência nas decisões decorrentes dos esforços de implantação e operacionalização”, destaca a Carta.

Ainda de acordo com o documento, será necessário o desenvolvimento de um plano estratégico de prevenção, promoção e intervenção, visando à redução dos impactos sociais, e maior governabilidade. Para isso será necessário o envolvimento e sensibilização das instâncias de controle social existentes nos estados e municípios. Além da criação de um Observatório Social da UniRila, com coordenação geral e coordenações institucionais.

Para a professora Renata Vidal Cardoso, do curso de Medicina da UEMS, é importante ter a visão do que as mudanças irão provocar, “para que possamos atender os anseios da população da região e ajudar a enfrentar esses acontecimentos. O setor de saúde deve trabalhar questões de prevenção dos riscos de adoecimento individual e coletivo. Isso se faz quando conhecemos os grupos de doenças que nos deparamos quando modificamos um ecossistema, o estado imunológico da população local. Para isso uma parceria entre as Universidades é muito importante”, explicou.

"A rota será mais que um tráfego de mercadorias, será um fator de integração dos nossos territórios, será uma janela de oportunidades."

Jaime Gazmuri Mujica

Embaixador do Chile no Brasil
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